Análise da Família Alves
Quando o fundador resiste em ceder o controle dos negócios
A história que Rodrigo compartilhou sobre a resistência do seu pai, Cláudio, em delegar responsabilidades e transferir o controle da gestão é uma questão que muitas famílias empresárias enfrentam, especialmente no agro, onde as tradições e o legado familiar desempenham papéis significativos.
Lembro-me de um caso semelhante que vi há alguns anos com uma família fictícia que podemos chamar de Família Alves. O patriarca, Sr. Fernando Alves, havia construído um império agropecuário ao longo de décadas de trabalho junto com seus pais e avô. No entanto, à medida que envelhecia, seus filhos começaram a expressar o desejo de participar mais ativamente na gestão da empresa, trazendo novas ideias e abordagens atuais para enfrentar os desafios do mercado.
O dilema do Sr. Fernando era compreensível. Para ele, a empresa não era somente um negócio, era uma extensão de sua identidade e das suas conquistas pessoais. A ideia de abrir mão do controle era assustadora, pois lhe parecia que estava perdendo parte de si mesmo. Entretanto, essa resistência estava começando a criar tensões entre os membros da família, algo que poderia prejudicar tanto a harmonia familiar quanto o futuro da empresa.
Ao trabalhar com a Família Alves, focamos em algumas estratégias que poderiam ser benéficas para sua situação. Primeiro, iniciamos um diálogo aberto e honesto entre Fernando e seus filhos, criando um espaço seguro onde todos pudessem expressar seus sentimentos e preocupações sem julgamentos. Esse simples passo ajudou a aliviar algumas das tensões e permitiu que todos entendessem melhor as perspectivas uns dos outros. Veja mais em https://youtu.be/nrl47L6eNRE?feature=shared “Por que o diálogo é fundamental nas famílias empresárias?” e https://youtu.be/ieP6Fqk1RjM?feature=shared “Diálogo aberto: como espaços para a comunicação apoiam a governança e a sucessão familiar.”
Em seguida, trabalhamos na criação de um plano gradual para a recepção dos sucessores nos negócios. Isso envolvia identificar áreas específicas do negócio onde os filhos poderiam começar a assumir mais responsabilidades, permitindo a Fernando ver em primeira mão suas capacidades e fortalecendo sua confiança na nova geração. Implementamos também um programa de mentoria, no qual Fernando poderia guiar seus filhos, transmitindo seu conhecimento enquanto eles traziam novas ideias à mesa. Simultaneamente, inserimos no processo uma equipe dedicada ao cuidado psicológico do Sr. Fernando, que há muito tempo estava intocada. Acolhendo, mostrando as novas possibilidades e entendendo o sentido de tudo naquele momento para ele.
Por último, mas não menos importante, ajudamos a família a estabelecer uma estrutura de governança clara. Isso incluía a criação de um conselho de consultivo que pudesse oferecer suporte e aconselhamento estratégico, durante a transição de liderança e, consequentemente, dali em diante. Com membros da família e externos, esse conselho atuava como um árbitro neutro, ajudando a tomar decisões informadas que beneficiavam o negócio como um todo.
Essas estratégias facilitaram uma transição mais suave para a Família Alves e fortaleceram seus laços familiares, garantindo que a empresa sobrevivesse e prosperasse sob a nova liderança.
Em uma pesquisa recente, conduzida pela Evermonte Executive Search entre julho e agosto de 2024 mostrou que quase metade das empresas no Brasil, cerca de 49,2%, não possui um plano de sucessão formalizado. Entre as que implementaram algum tipo de programa, 35,4% têm iniciativas não divulgadas aos seus colaboradores. Apenas 6,9% das organizações realizam plenamente as melhores práticas: estabelecem um plano estruturado de sucessão, comunicam-no claramente às equipes e acompanham essas ações com programas de desenvolvimento para gestores. (https://www.linkedin.com/posts/evermonte_voc%C3%AA-sabia-que-quase-metade-das-empresas-activity-7247982190557294593-IrIx?utm_source=share&utm_medium=member_desktop )

O estudo, acessado exclusivamente pelo Valor, incluiu 161 executivos de alto escalão, incluindo gerentes seniores, diretores executivos e membros de conselhos, de empresas com diferentes níveis de faturamento: até R$ 500 milhões (39,2%), entre R$ 500 milhões e R$ 2 bilhões (38,5%), e acima de R$ 2 bilhões (22,3%). Os principais setores representados na pesquisa foram serviços (12,3%), agronegócio (10,8%) e automotivo (10%).
Esses dados ressaltam um desafio significativo para o futuro das empresas brasileiras: a necessidade de preparar a próxima geração de líderes de forma eficiente e transparente. A ausência de planos de sucessão bem estruturados e comunicados pode comprometer a continuidade dos negócios e a competitividade no mercado. É fundamental que as organizações priorizem o desenvolvimento de estratégias de sucessão robustas, que além de identificarem potenciais líderes, os preparem para assumir responsabilidades maiores.
A transição de liderança pode ser desafiadora, mas com a abordagem correta, pode se tornar uma oportunidade incrível de crescimento e renovação para todos os envolvidos.
Ronaldo Behrens
Sócio ABC / PhD. PXLeader / Professor FDC
Nota: Os nomes mencionados são fictícios, assim como a troca de e-mails apresentada. Este texto é uma ilustração baseada em experiências reais no atendimento a famílias empresárias.