Análise da Família Soares
Quando os sucessores não têm interesse no negócio.
A Fazenda Soares é uma das mais respeitadas na região por sua produção de café de alta qualidade. No entanto, está enfrentando um tipo de desafio que é comum e igualmente devastador para muitas famílias empresárias: a falta de interesse dos herdeiros e o despreparo dos sucessores para assumir o comando.
José Soares, o atual patriarca, dedicou sua vida ao cultivo e à expansão da fazenda. Contudo, à medida que ele se aproxima da aposentadoria, a preocupação cresce sobre quem assumirá o leme da operação. Seus três filhos, todos com carreiras estabelecidas em áreas completamente diferentes, não demonstram o menor interesse em seguir os passos do pai no agronegócio. Carla, a mais velha, trabalha como designer em São Paulo; Lucas, o filho do meio, é um programador em uma startup de tecnologia nos Estados Unidos; e Marina, a caçula, está envolvida em projetos sociais no Rio de Janeiro.
Diante da falta de interesse inicial dos filhos, José percebe que eles ainda não tiveram a oportunidade de se familiarizar com a gestão agrícola ou com os aspectos operacionais da fazenda. Essa situação traz uma preocupação natural para José, que deseja garantir a continuidade da fazenda sob a administração familiar. Ele reconhece a importância de preparar os filhos para o futuro da propriedade, acreditando que, com o apoio e o treinamento adequados, eles poderão desenvolver as habilidades necessárias para assumir essa responsabilidade no tempo certo. Essa preparação pode abrir um caminho para que eles se envolvam de forma significativa e integrada com o negócio da família.
José sempre esteve à frente da tomada de decisões na fazenda, o que é compreensível dada a sua vasta experiência e dedicação. No entanto, ele agora vê uma oportunidade de compartilhar esse conhecimento e responsabilidade com os filhos. Ele está considerando a importância de criar um ambiente onde cada um possa contribuir e se sentir motivado a participar mais ativamente. Isso envolve a elaboração de um plano de sucessão que atraia o interesse deles e inclua um programa de capacitação que os ajude a se preparar para futuros papéis na gestão, caso escolham se envolver mais diretamente com o negócio familiar.
Uma solução potencial que José pode considerar é a contratação de um gestor profissional temporário, alguém que possa manter a fazenda lucrativa, servir como mentor para os filhos, caso decidam se envolver no futuro. Ele também pode explorara possibilidade de estabelecer um conselho consultivo que inclua os herdeiros, para que eles comecem a participar das decisões estratégicas, mesmo que inicialmente à distância.
José também pode pensar em buscar parcerias com universidades e centros de pesquisa para trazer inovações para a fazenda, tornando o agronegócio mais interessante para os filhos. Mostrar que o setor está em constante transformação pode despertar neles um novo olhar sobre o potencial da fazenda.
No contexto da Fazenda Soares, o desafio enfrentado é um reflexo de uma situação mais ampla que está ocorrendo globalmente. De acordo com estudos do IFO Institutee da Foundation for Family Business de Munique, o chamado “problema Buddenbrook” tornou-se um fenômeno sistêmico na economia europeia. Muitas empresas familiares na Alemanha, que foram transformadas em potências pelas gerações anteriores, agora enfrentam a aposentadoria desses líderes. A pesquisa revela que 43% das empresas familiares devem transferir a gestão ou participação acionária para herdeiros, no entanto, apenas 42% dessas empresas contam com herdeiros na família. Além disso, apenas 34% estão em posição de gerenciar efetivamente uma transição. (fonte: Bloomberg Línea). Leia mais: https://www.bloomberglinea.com.br/2024/02/04/por-que-a-falta-de-herdeiros-se-tornou-um-obstaculo-para-as-empresas-familiares/
Esse cenário sugere um enfraquecimento do dinamismo familiar com proprietários envelhecendo e a ausência de sucessores preparados ou dispostos. Assim, a falta de planejamento de sucessão está levando a transferências para gestores externos ou até mesmo a vendas, muitas vezes forçadas, para terceiros. Essa situação ressalta a importância vital de se preparar e adaptar, garantindo que os legados familiares possam prosperar e se manter relevantes perante as transformações do mercado.
Ronaldo Behrens
Sócio ABC / PhD. PXLeader / Professor FDC
Nota: Os nomes mencionados são fictícios, assim como a troca de e-mails apresentada. Este texto é uma ilustração baseada em experiências reais no atendimento a famílias empresárias.